Francisco Guilherme de Almeida Jesus
(...) Subitamente – que visão de artista! –
Se eu transformasse os simples vegetais,
À luz do sol, intenso colorista,
Num ser humano que se mova e exista
Cheio de belas proporções carnais!?
E eu recompunha, por anatomia,
Um novo corpo orgânico, aos bocados.
Achava os tons e as formas. Descobria
Uma cabeça numa melancia,
E nuns repolhos seis enjetados.
As azeitonas, que nos dão azeite,
Negras e unidas, entre verdes folhos,
São tranças dum cabelo que se ajeite;
E os nabos – ossos nus, da cor do leite,
E os cachos d’uvas – os rosários d’olhos.
Há colos, ombros, bocas, um semblante
Na posição de certos frutos. E entre
As hortaliças, túmido, fragrante,
Como dalguém que tudo aquilo jante,
Surge um melão, que me lembrou um ventre.
E como um feto, enfim, que se dilate,
Vi nos legumes carnes tentadoras,
Sangue na ginja vivida, escarlate,
Bons corações pulsando no tomate
E dedos hirtos, rubros, nas cenouras (...).
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